Rondiney dos Santos Silva
Carla Patrícia Cambraia dos Santos
Marcos Antônio Macedo Pedrada
Universidade Federal do Amapá
Curso: Artes Visuais
Artigo científico apresentado a disciplina
História da Arte Contemporânea, sob a orientação
do Profº. Mestre Humberto Mauro.
Resumo: Este artigo busca abordar a relação entre Arte, Discurso, Filosofia e Conceito da arte praticada em terra amazônica (Amapá), considerando a obra artística de Carla Marinho, uma das que tenta resgatar esse princípio harmonioso na arte. O ensaio traz como exemplificação, alguns dos diversos trabalhos artísticos produzidos por ela recentemente, e ao mesmo tempo elabora-se uma comparação entre o ponto de vista desta artista e as perspectivas da contemporaneidade assim como as denúncias sociais ligando-a com outros artistas de mesma envergadura e de suportes semelhantes.
Palavras-chave: Carla Marinho, Arte Contemporânea, Estilo amazônico.
INTRODUÇÃO
“Arte da Amazônia/ Amapá” e “Contemporaneidade” – eis aqui uma discussão relativamente antiga, mas sempre atual e polêmica. Através da História da Arte contemporânea se tem percebido a questão do contraste entre a arte e público, na interação do discurso artístico sobre a obra (objeto). Artistas amapaenses como Carla Marinho, se inserem na arte contemporânea desenvolvendo uma poética que enfoca temáticas do cotidiano de indivíduos que vivem na miséria, trabalhadores na informalidade, exploração infantil. Dessa forma o presente artigo tem o objetivo através de uma abordagem sociológica e sucinta, identificar o estilo em que a obra: Madeiras sobre - viventes se enquadra.
DESENVOLVIMENTO
Situação essa que não ocorre só em Macapá, a correlação que se faz aqui com arte contemporânea esta diretamente ligada ao suporte e discurso inserido através das pinturas e a exploração mais consciente das possibilidades de encontro ou desencontro entre Arte e Conceito, Arte e Filosofia, Arte e ‘Pensamento sobre a Arte local’, e pode-se indicar, entre os anunciadores menos ou mais sistemáticos destas múltiplas direções reflexivas, artistas que vão de Rubens Gerchman a Lasar Segall – que abordam questões sociais em muitas de suas obras, Marinho denominou sua amostra de “Madeiras Sobre-Viventes” fazendo um trocadilho entre sobreviventes do cotidiano e questões ambientais como o desmatamento 1929 pintou a primeira versão do quadro “A traição das imagens”. Neste quadro a artista pinta, habitualmente associado à estética contemporânea quesito suporte e discurso produzindo a imagem de algo que um observador comum tenderia automaticamente a identificar com um “desenho infantil”, e logo após desta imagem registrava-se uma denúncia social. Labuta VII o picolé
Fig.1. Carla Marinho. Labuta VII o picolé - 36 x 22 cm – 2007 |
Tratava-se, por um lado, de afirmar o que deveria ser óbvio: que uma imagem desenhada com caneta esferográfica preta e com intervenções de tinta acrílica nada mais seria que uma imagem – linhas e cores dispostas sobre um caixote – e que o objeto de arte nada mais é do que um objeto de arte. Mas este desenho mostra, por outro lado, como uma espécie de sintoma de novos significados e possibilidades que não demoram muito a produzir múltiplas interpretações. Este jogo de contradição entre a Imagem infantil e a expressão social verbal que a ela pretende se referir – ou o seu contrário, o jogo de reiteração entre a Imagem e uma expressão que a confirma, entre a Imagem e o gesto que a recoloca em um novo contexto de circulação artística regional, entre o objeto e a série que o repete sempre com a mesmo temática – estas geram possibilidades vinculadas a temas sociais das minorias excluídas mergulhando cada vez mais nos meandros da arte contemporânea com suas próprias auto - definições. O mesmo se pode dizer do enlace entre Arte e discursos regionais, que alguns estudiosos apontam como um enlace até certo ponto fatal, pronto a destruir a Arte local (amazônica), no sentido em que esta fora tradicionalmente de padrões concebida na história da arte ocidental.
Os maiores experimentadores nestes vários campos de possibilidades foram certamente a geração pós 1950, que passaria a afirmar categoricamente que “ser um artista agora significa questionar a natureza e a função da arte”. Não são poucos os que, na década de 1960, engajaram-se precisamente no âmbito daquilo que passou a se chamar “arte contemporânea”. Mas em Macapá a demanda de artistas que trabalham o cotidiano local e relativamente grande, tanto sob a forma de texto, como sob a forma de intrigantes obras que imbricavam objeto de arte, linguagem e conceito – reunindo por vezes um objeto, uma representação do mesmo objeto, e uma verbalização escrita acerca deste mesmo objeto. A obra de arte e a ‘idéia da obra de arte’ aparecem desta maneira unidas explicitamente – em campos distintos, mas reunidos em uma mesma representação atual.
Antes de discutir estas obras em que Carla Marinho, defende a Arte local com características contemporânea, convém registrar alguns dos movimentos e contextos que acompanham estes novos gestos artísticos. A década de 1960, para além de uma década de questionamentos que também se volta para a própria Arte, é a década artística onde se verifica mais intensamente o fenômeno daquilo que alguns estudiosos chamaram de “campo expandido do objeto artístico”. Alguns artistas associados à chamada Vanguarda Artística da arte ocidental já não se sentiam mais a vontade em trabalhar compartimentada e isoladamente com os gêneros artísticos tradicionais – a pintura, a escultura, a arquitetura, a literatura. Eles começavam a questionar os limites e fronteiras que determinavam estes gêneros, ao mesmo tempo em que questionavam também o que era a Arte como um todo. Marinho como uma artista nova em termos de referencias de obras, está na ponta do ice Berg de características passadas e que ao mesmo tempo são tão atuais, vinculada a uma necessidade de vincular estas questões estéticas com a cultura tucuju, embora muitos artistas rejeitem tais necessidades e tenham esse tema em separado:
"Por um lado, não parece mais haver nenhum material particular que desfrute do privilégio de ser imediatamente reconhecível como material de arte: arte recente tem utilizado não apenas tinta, metal e pedra, mais também ar, luz, som, palavras, pessoas comida e muitas outras coisas”. [ACHER, 2001].
Estas formulações têm certamente a sua história. Elas constituem a maturação de uma trajetória que conduziria Carla marinho a afirmar através sua obra de maneira muito clara que “a Arte não é mais que uma forma de representação da realidade”. Nascida em Macapá- AP Brasil em 1979, Carla Marinho impôs-se desde muito jovem no processo criativo. Suas primeiras experiências datam de 2001, com o grupo performático ‘Invólucro’ perpassando por exposições coletivas nos últimos cinco anos, uma de suas exposições mais divulgadas foi à série de obras denominada “Madeiras Sobre-Viventes” [2006]. Como idéia tratava-se de um conjunto de obras que nada mais é do que desenhos do cotidiano que lembram e tem um ar ‘infantil’.
Lembrando em muitos aspectos o grafite - por exemplo, “labuta X - a flor -... é crime”, retrata uma das segundas premissas da exposição da artista, Marinho (2006) “Pois madeira, em seu próprio significado literal, representa algo forte, bruto, constituída de fibras, a escolha do nome para a exposição seria uma representação simbólica do “peso” dos problemas e das dificuldades que “caem” sobre essas pessoas e que têm de enfrentar em seu dia-a-dia”.
E que a foram ampliadas também na vida das crianças, a escolha do tema apresentado vislumbrando características bem peculiares da região amazônica: economia informal, questão ambiental e sua ligação com o meio sócio econômico deficitário. Aqui ha uma reiteração ponto a ponto dos vários elementos que definiam o projeto da série: “Madeiras sobre- viventes” porque a série destina-se a apresentar-se como produção artística, “significado” onde cada obra gira em torno de significados semelhantes e contínuos.
Fig.2. Carla Marinho. Labuta X - a flor -... é crime- 36 x 22 cm - 2007 |
A respeito das obras da série “Madeiras sobre- viventes”, percebe-se que as temáticas não estavam só na pintura, mas sim nas idéias que elas representavam como o suporte ‘caixas descartáveis que antes serviam para transportar frutas’ e a “fácil identificação pictoral”, percebe-se aqui que começa a ser separado muito claramente a Arte de sua mera elaboração artesanal situando-a em um plano de idéias e contexto social.
“Artistas contemporâneos podem trabalhar com variados veículos expressivos, da pintura às instalações, do desenho à fotografia, podendo discutir em seus trabalhos questões existenciais, sociais, políticas, ou absolutamente as relações formais e estruturais das suas pesquisas poéticas. Tais situações classificadas como Arte Contemporânea, emergem com força na história a partir das décadas de 50 e 60, persistindo nos dias de hoje, em atividades artísticas isoladas, ou em movimentos já situados no tempo e espaço” [VERA MARQUES, 2004].
De fato, para a Arte contemporânea – e não apenas na serie de Carla Marinho, como também para outros artistas de nível local, nacionais ou globais ligados a esta tendência – concordam que a idéia é o aspecto mais importante da obra, com todas as implicações daí decorrentes. Uma historiadora e escritora de arte contemporânea chamada Cauquelin (1997) diz “discussão sobre o que é contemporâneo em artes visuais passa por uma série grande de questões de ordem conceitual, apoiados em estudos consagrados” podemos afirmar que é contemporânea toda produção que trata de temas contemporâneos com formas, suporte e textos contemporâneos.
Percebe-se aqui a idéia de fundo que habilitará as próximas décadas na arte, dando suporte a uma elaboração artesanal do objeto artístico Marinho (2006). O material utilizado nas obras serão caixotes de madeiras desmontados, que serão recolhidos em supermercados da cidade, tinta acrílica, e caneta esferográfica preta. Por assim dizer, não seria mais do que reiteração da Arte feita de maneira artesanal analisada e concebi pelo artista como algo concreto e que não fica só no plano da idéia como a arte conceitual fazia. Uma obra de Arte planejada e idealizada já por si só teria conquistado a sua existência.
Aqui aponta- se três situações possíveis, para objetos artísticos que servem de modelo até hoje. Numa delas o artista chegava a arquitetar a peça; na outra ela podia ser fabricada a partir de suas indicações e técnicas, e numa terceira possibilidade ela sequer precisaria ser construída. Desta forma, Carla Marinho se encaixa na segunda situação por que costuma criar, desenhar, pesquisar suporte, formas e expõem seus trabalhos em espaços culturais e não só apenas as instruções para a sua obra,ou somente a idéia artística que poderia ser realizada efetivamente (ou não).
Voltando a Carla Marinho com sua simplicidade consegue conscientizar através de seus esboços na serie agora com madeiras mescladas notabiliza como representação da revolução conceitual e cria em cima do que já estava pronto. “Mescla de madeira VI” [2007] tem uma característica singular que é o corte na figura depois é reaproveitada em outros pedaços similares dando um sentido hibrido na própria imagem. Com ela a artista apresenta o mesmo tema agora com ênfase na forma de como foi organizada a figura, acompanhando-as ainda de um fundo que se não esclarece confunde ainda mais, nesta exposição os caixotes ainda tinham um auxilio “Será montado também, um painel de 75 x 55 cm para o texto da exposição que será manuscrito com lápis carvão. O mesmo poderá ser um poema ou uma crítica sobre a desigualdade social” (Marinho 2006).
Fig.3. Carla Marinho. Mesclas de madeira VI - 82 x 53 cm - 2007 - acrílica s madeira |
Ela explora possibilidades artísticas em todas as direções. Poderemos até dizer que ela flerta e dialoga com a chamada Arte Minimalista ou como uma forma de representar com materiais simples uma valoração artística assim como fez Duchamp ao usar matérias simples do cotidiano para dar uma linguagem artística.
Conclusão
Em termo de análise podemos considerar que este trabalho é rico em sua dimensão social e cultural, pois apresenta em sua poética temáticas que levam em conta questões do cotidiano amazônico, como por exemplo:as pessoas de pouco poder aquisitivos e aquelas que são excluídas por algum tipo de preconceito ou por viverem a margem da sociedade.
Outro ponto a ser alavancado dentro da ótica da arte é a valiosa relação que a obra tem com a vida, haja vista que toda obra de arte deve esta relacionada ao contexto em que está inserida, e sem dúvida afirmando o que diz Ana Mae Barbosa: “arte fora de um contexto histórico é arte sem memória”. A trajetória da serie de trabalho- madeiras sobre - viventes faz um link com os dramas que vive cada pessoa representada pela a artista.
Dessa forma o seu olhar critico nos ajuda a entender através de sua obra, a maravilhamento dessa relação arte e vida dos povos da Amazônia em todos os seus aspectos humanos (sentimentos) e físicos (geográfico), e em contrapartida nos remetem ao entendimento critico que todos os elementos - linguagem, poética, e discurso – na obra se enveredam às tendências de um estilo universal.
Referencial Bibliográfico:
DIDI-HUBERMAN, G. O que vemos, o que nos olha, São Paulo: Editora 34, 1998.
WITTGENSTEIN, L. Tratado Lógico - Filosófico – Investigações filosóficas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1987.
ARCHER, Michel. Arte contemporânea: uma historia concisa. Trad, Alexandre Krug. Valter Lellis Siqueira.- São Paulo: Martins Fontes, 2001.
MARQUES, Vera. Arte contemporânea: quem tem medo? ECA/UFRJ. Caderno de cultura. Vol.11 n.3. 2005. Disponível em:<HTTP://scielo.br/scielo.php? pid= S010237722002000300009escript=sci_abstractetlnpt>
Fonte: Artigo disponibilizado pelos autores.
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